Meu amor, que rosto tu tens?
Diz-me, pois nunca te esqueço.
Que trazes sob os cabelos negros?
(Penso que a escuridão te cobre à cabeça)
A infância? O sono?
Quem sabe tenhas sofrido um choro,
De um choro tão chorado,
Que escondeu de imenso triste.
Este, enfim, outro, que trazes em cabide,
Bem mais cílios do que olhos,
Já pouco te ofende.
Quantas meninas distraídas cobriram-te de vergonha e medo
Com suas mulherices em brotos, pelas carnes,
Só por teus nus pensares?
- Aflitos pensares testemunhando o súbito ridículo das
calças –
Ah, os breves pedacinhos de pele!
É que as saias te impressionavam com dolorida curiosidade,
O tecido opaco e plissado,
Porta sanfonada de entrada ao paraíso dos açucares.
Na verdade, as saias
mexiam-se como nuvens encobrindo o céu.
E tu ansiavas pelo universo,
No entanto, uma dor de delícias havia em cada névoa,
Onde tua imaginação ditosa corria frouxa.
Quantas vezes partistes sem limites, sem horas de ir,
Como moeda que cai num bueiro,
Sem a própria aquiescência,
Apenas porque há caminhos e acasos?
Quantas vidas morreram em cada ida?
Ainda que sujas, de poucas mãos e muitos dicionários,
Ainda que grande, de deslumbrâncias e sacrários,
A vida é muito mal explicada, mas uma coisa é certa, não tem
ré.
Quais foram às praias em que abandonastes os cadáveres,
Tantas suposições de vidros,
Filhos que não nasceram,
Amores desentranhados,
Casas que não habitastes,
Porcos que não cevastes,
Por um oceano temperamental, mas vivo?
Tal mar, infindável, da medida deste meu frêmito por ti,
Não fadiga o amor, pois o mantém em leve brisa,
Salvo na distância, sem morrer nem matar.
O mar é sabedor das desnecessidades
E os homens colecionam mortos.
Diga-me, amor meu, das tuas urgências,
Da poesia que colastes nos olhos,
Deste corpo, em relevo e sem promessas,
Jamais visto em meus territórios,
Mas tão mais real que os pensamentos,
Os que nunca falam, os meus!
Que rosto tu tens?
Tire o lenço do bolso e acena-me os teus sonhos,
Que os dormirei acordada só por ti,
Nos dias em que te amo eternamente,
Sem esquecer-te.
11 comentários:
Ira, a gente se esconde sem saber se esconder. Uma hora ou outra alguém vem e nos capta e as respostas são tão brevemente respondidas, pois que não há palavra que seja necessária.
As únicas necessárias, aqui, são as suas.
Um beijo.
Um poema intimista, onde purga uma realidade deveras sentida. Parabéns!
que retrato impressionante!
confesso que vez ou outra me disperso em cantos longos, mas os teus mantém-me estreitamente atenta- parabéns!
beijo, poeta irada*
Ira minha linda tua poesia soa como musica ,tuas falas como o teatro que retrata a alma de um rosto que não se faz presente mas que não esta distante do que queres ver.
Beijos Amiga!!
Ira, lindona!
"Que rosto tu tens?"
Penso que já não seja nem mais condição para um amor, e sim necessidade.
O que já fez suas marcas, de certa forma, mostrou um pouco a face, e mais ainda, nossa própria face.
Poesia poderosa tens aqui!
Grande beijo e ótimos dias!
como num mosaico tento recriar este rosto tão vário e singular, oh quão dessemelhante
beijo
Ira,
Ler vc é sempre um doce fascínio!...
Beijos,
AL
"A vida é muito mal explicada, mas uma coisa é certa, não tem ré."
Me identifiquei! Eita, eu sou
tão clichê rsrs o que não
me impede de adorar ler
tudo por aqui. Beijo;)
o rosto do amor...
o rasto do amor...
o arrasto amor...
o resto do amor...
o risco do amor...
o arisco amor...
o rosto no rasto arisco com resto e risco.
arrisco?...
beijos, poeta das minhas contemplações. quantos soldados marcham nos nossos corpos de gente ambulante?
Ira, linda aquariana!
Ainda não comentei lá no Jorge, mas já dei minha olhadinha...,
garota... que incipit PODEROSO! Aliás, o pouco que conheço de tua poesia, ela é toda instigante, forte, de mulher sábia.
Parabéns!
Precisava te dizer isso.
Ótimo fim de semana, grande beijo!
Ira, rendo-me à tua poesia, sim tu é que és detentora da sensualidade e da revolta nos teus poemas. À tua beira, sou mera aprendiz e tu uma mestre bem sábia.
A procura de um rosto, que talvez não exista...
Beijo
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